O livro de contos Fogo Fátuo, de Maurício Coelho, é composto de 26 narrativas curtas sobre temas variados. Com um texto leve e bem humorado, o autor nos mostra o seu lado mais crítico sobre aquilo que vê do mundo a sua volta. Quase todas as histórias passam-se em Belém, cidade natal do autor. Os personagens são os mais variados, desde pessoas de todas as idades e classes sociais, até animais que falam. Trarei um pouco sobre alguns dos contos, aqueles dos quais gostei muito, mas aproveito para dizer que os meus preferidos foram: Fogo fátuo, que dá nome ao livro, Amor virtual e amor real e O corvo.
Em Fogo fátuo, Gilmar recebe a visita do amigo Ramiro. Em um passeio na beira do rio, Ramiro conta que, certo dia (ou noite, na verdade), tivera a visão de uma criatura toda de fogo sobre a água. Gilmar não acreditou, então Ramiro o desafiou a passarem a noite na beira do rio, esperando a tal criatura. Fizeram uma aposta, valendo uma cerveja. Será que eles verão o ser de fogo? Posso dizer que o conto é uma bem humorada surpresa para quem espera uma narrativa sobrenatural.
O conto seguinte é A gatinha que atravessava a rua, e narra sobre uma gatinha de três cores, preta, laranja e branca, que vivia atravessando a rua para lá e para cá, olhando para os dois lados ao atravessar. Mas essa não era a única habilidade da gata, pois ela era capaz de falar. Em O urubu, a garça e o peixe, três urubus reuniam-se na feira todos os dias para deliciarem-se com restos de peixe. No entanto, um deles estava um pouco cansado disso, e resolveu ir embora, alçando voo. Em sua aventura, conheceu uma garça e ficou encantado com a sua beleza. Com a graça, ele aprendeu a mergulhar para conseguir peixe. Dessa forma, o urubu acaba conhecendo um peixe que o faz refletir sobre a sua identidade e sobre a sua essência de urubu, ajudando-o a aceitar a sua natureza.
O velho rabugento traz a história de um idoso que vivia em uma casa toda gradeada, e passava o seu tempo a varrer as folhas que o vento teimava em trazer de volta, sempre reclamando, tentando encontrar um culpado para as folhas que cobriam o seu quintal. Até que uma determinada conversa o faz refletir sobre a responsabilidade que tem sobre o que acontece em sua vida. A osga e a senhora conta sobre uma idosa que queria acabar com certa osga que estava "hospedada" em sua casa, sem levar em conta o quão importante é cada criatura que compõe o ecossistema. Até que adormeceu e teve um sonho revelador, que a fez mudar a visão que tinha sobre a pobre osga. Em A sala dos professores, quando os mestres reuniam-se, o assunto era sempre o mesmo: aposentadoria e viagens. Naquele dia, o estagiário observava divertido os planos e os comentários dos mestres na sala dos professores.
No conto A suindara, o animal botou um único ovo, pois o ambiente não era propício para muitos filhotes. Após 32 dias, o ovo eclodiu e nasceu uma pequena suindara, que ao crescer tornou-se um grande leitor. Vocês não imaginam que livro o bichinho está lendo! Em A borboleta e os mosquitos, havia uma pobre borboleta que era muito feia, por isso, ninguém gostava dela. Então, ela se refugiou com os mosquitos, que também não se importavam muito com ela, para falar a verdade. O fim da infeliz borboleta é inusitado, mas nos faz refletir sobre a importância de nos aceitarmos como somos.
O conto Amor virtual e amor real nos apresenta um homem e uma mulher que se conhecem em um chat e, após constatarem as afinidades, começam a trocar e-mails, até que se apaixonam. Será que esse amor tem futuro? O conto é composto pelos e-mails trocados e, ao final, pelo registro de um desabafo do homem em seu diário. Uma bela reflexão sobre os amores idealizados. Em O corvo, um jovem brasileiro que mora nos Estados Unidos lê um livro sobre magia negra. Está profundamente aborrecido com a má leitura, mas não tem outra coisa para fazer, então continua lendo, até que cansa e vai dormir. Em seu quarto, vê pela janela uma ave em chamas, uma fênix. Seria um sonho? Seria real? O que significa?
A coruja à luz do dia é um conto futurista que narra a história de um menino que, ao voltar da escola, descobre que Brasil e Estados Unidos estão em conflito pela então mirrada Floresta Amazônica. O conto traz uma reflexão sobre os rumos que estamos dando ao nosso tão maltratado planeta. Em Mensagem, Lucas Barros chega à escola onde leciona para mais um dia de trabalho. Ao entrar na sala de aula, passa mal e sai sem dar explicações a ninguém. Sentia-se como se estivesse sendo seguido por alguém. Então vai a uma igreja e a sensação some, sai da igreja e ela volta, chega à casa de sua mãe, onde há imagens de santos e a sensação passa novamente. À noite, Lucas tem um sonho (de arrepiar) que o faz entender o que está acontecendo.
Como podemos facilmente constatar, o autor de Fogo Fátuo é bastante versátil na escolha dos temas. Embora os contos tragam algum tipo de crítica sobre questões do cotidiano ou, ainda, alguma reflexão sobre assuntos relevantes, a leitura é muito leve. Recomendo a obra a todos que queiram uma leitura divertida e bem humorada sem abrir mão da profundidade.